segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

DO BARROCO À MÚSICA CONTEMPORÂNEA I


 
 
De J.S.Bach a Igor Stravinsky, da "Toccata e Fuga em Ré menor" à "Le sacre du printemps", da Missa em Si menor à "Pássaro de Fogo", da força tonal ao atonalismo e seus consequentes dodecafonismo e serialismo, há de se falar em muitos anos de evolução e revolução na seara musical. Variados compositores e intérpretes fizeram e fazem parte de toda essa história, cada qual com seu método e sistema. Será que podemos falar em sistema composicional no estilo barroco? Mozart foi ou não um defensor das formas musicais? Beethoven utilizou de muita subjetividade em suas composições? Como entender Liszt e explicar seu virtuosismo? Existiram, de fato, momentos de "atonalidade" na obra de Wagner? Foi a obra de Debussy impressionista? Poderia Schöenberg analisar as obras de Stravinsky e Bártok a partir de seus conceitos acerca do atonalismo e dodecafonismo? As indagações e a necessidade de respostas que satisfaçam a nossa curiosidade são proporcionais à intensidade das mudanças que ocorreram na ciência e prática musical durante muitos séculos de música.

PERÍODO BARROCO

Na era barroca (1600 - 1750), a música foi marcada por um momento de transição muito importante. O período medieval e renascentista, anteriores ao barroco, haviam consolidado a música instrumental como forma de acompanhamento à música vocal, colocando em segundo plano a importância de pequenas formações instrumentais, tais como a música de câmara. No estilo barroco, peças para instrumentos solo foram compostas, muita música de câmara foi posta em prática e formas musicais foram consolidadas. Surge a forma composicional da Suíte Barroca, a qual era composta por diversas danças, tais como "Allemande", "Courante", "Sarabande", "Gigue", "Chacconne", "Govotte", "Bourée", dentre outras. Cada dança possuía forma própria, porém o conjunto, a suíte, mantinha sempre, ao longo de todos esses "movimentos", o mesmo tema/motivo. Compositores como Georg Friedrich Händel, Claudio Montiverdi, Alessandro Scarlatti, Antonio Vivaldi, Jean-Baptiste Lully, Jean-Philippe Rameau, Henry Purcell, Johann Hermann Schein, Johann Jakob Froberger, Heinrich Schütz, Michael Praetorius, Georg Philipp Telemann, John Dowland (renascentista/barroco), Weiss, dentre outros, compuseram muita música vocal e instrumental. Porém, nenhum deles marcou a música barroca tanto como J. S. Bach. Obras como os "Seis Concertos de Brandemburgo", "O Cravo Bem Temperado", "Arte da Fuga" e as "Variações Goldberg" contribuíram fortemente para a consolidação dos conceitos da harmonia tradicional e das regras de contraponto. Composições para cravo, violoncelo e alaúde solo, música de câmara e orquestral, contribuíram para que Bach fosse considerado o pai da música ocidental. Verdadeiro "engenheiro" da música barroca, utilizou com total maestria a arte do contraponto. Em "Cravo Bem Temperado", o compositor alemão demonstrou toda sua técnica ao explorar os rigorosos caminhos percorridos pela melodia bachiana em diversos prelúdios e fugas. Em caráter especial, as peças para cello e alaúde solo merecem consideração. Seguindo a forma da suíte barroca, as seis peças para cello solo e as para alaúde formam o conjunto de danças mais belo do estilo barroco. Cabe ressaltar que na Espanha e na Itália o alaúde estava começando a ser substituído pelo violão, apesar da forte presença do instrumento no período. Apesar das características do estilo, algumas peças de Bach possuem melodias tão "subjetivas" que remetem ao individualismo e à emocionalidade do romantismo. O prelúdio da Suite 1 para violoncelo solo demonstra não apenas a sapiência técnica do compositor, mas também a sua capacidade de expressar, com certa simplicidade harmônica, enérgicas melodias. Em sede harmônica, a abertura do prelúdio se dá com alguns compassos de arpejo de Sol maior, momento no qual a melodia é exposta e posteriormente desenvolvida, mas basicamente a peça gira em torno de arpejos, sem momentos de completo afastamento do centro tonal. A "Sarabande" da Suite 6, em Ré maior, igualmente para violoncelo solo, contém uma das melodias mais "doces" compostas por Bach. A despeito de não haver grande realização harmônica nesta peça, o compositor explora a possibilidade instrumental de reproduzir a voz humana, pois representa uma melodia quase cantada. Dentre as composições para alaúde, a Suite BWV 998, "Prelude, Fugue & Allegro" (Ré maior) e a "Toccata e Fuga em Ré menor" merecem grande destaque, pois os caminhos da técnica contrapontística usada pelo compositor realizam interessantes movimentos melódicos e harmônicos que analisarei posteriormente.